Apenas mais uma viagem no Metropolitano
Estava eu absorto nos meus pensamentos e protegido da presença dos outros seres humanos na carruagem do Metropolitano pelos desnecessários óculos escuros quando, ao pararmos na estação da Alameda, entrou uma jovem mãe - ninguém lhe pediu o bilhete de identidade mas arrisco designá-la “demasiado jovem mãe” - com uma criança de um ano ao colo e uma expressão triste no rosto. Percorreu com o olhar os lugares sentados, tendo os respectivos ocupantes feito o seu melhor por ignorar a sua frágil presença enquanto resistia aos primeiros solavancos da imparável marcha da composição para Arroios. Até que um homem precocemente calvo, de aspecto rude e braços apropriados à execução de cobranças difíceis lhe fez sinal para que ocupasse a sua cadeira. A demasiado jovem mãe sorriu, sentou-se e viu as mesmas pessoas que, segundos antes se haviam feito despercebidas, brincar com a sua filha. Ao meu lado, o homem precocemente calvo pareceu-me feliz. E eu próprio - abstraindo a distância em relação às restantes formas de vida baseadas no carbono que ali me rodeavam - regressei, como sempre tendo a regressar, a um verso de Álvaro de Campos que abastardo a meu bel-prazer para lhe conferir um optimismo possível. O Universo reconstruiu-se-me com ideal e esperança. Mas estando uns quantos metros debaixo da Avenida Almirante Reis, ignoro se algum dono de tabacaria sorriu.
1 Comments:
Grande!
Post a Comment
<< Home