Nem mais um "post" para o referendo
Dizer que o "Sol" tem andado obnubilado é uma constatação que só peca por defeito. Mesmo assim, não posso deixar de dar os meus parabéns ao semanário de José António Saraiva - nem acredito que acabei de escrever estas palavras... - pela sondagem que faz manchete da edição que hoje chegou às bancas para não perturbar o dia de reflexão. Admito que não fiquei agradado com o resultado, o qual aponta uma vantagem de 18 pontos percentuais para o "sim" que talvez só uma brutal intempérie no domingo possa reverter. Mas o que me chamou a atenção foram as restantes perguntas colocadas aos portugueses pela TNSEuroteste: então não é que 58,7 por cento do eleitorado aprova a completa liberalização do aborto até às dez semanas mas só 35,4 por cento aceitariam o casamento entre homossexuais e míseros 29,7 por cento aprovariam o direito dos supracitados casais a adoptarem crianças? Sim senhor. Ao longo desta campanha fartei-me de ouvir - o que vale é que creio em certos ditados populares, como aquele do "o que vem de baixo não me atinge" - que os eleitores do "sim" são humanistas esclarecidos amigos da liberdade enquanto o "não" é constituído por uma amálgama de beatos que olham para todos os ramos das árvores à espera de terem visões, sádicos que adoram atirar mulheres desfavorecidas para celas imundas, bem-intencionados com falta de neurónios para entender o que "realmente está em causa" e sacripantas da pior espécie. É uma dicotomia que vale o que vale. Mas agora pergunto a quem acredita nisso: não ficam um nadinha aborrecidos por tão vasta fatia do vosso eleitorado - e até já estou a abstrair casos, como o meu, de eleitores do "não" que em nome da liberdade que não colide com outras liberdades votariam "sim" em referendos sobre o casamento de homossexuais e a adopção de crianças por casais homossexuais, o que ainda torna a aritmética mais interessante - aceitar uma propalada liberdade de escolha para as mulheres ao mesmo tempo que recusa os mais fundamentais direitos a cidadãos devido à sua orientação sexual? Não é curioso que 58,7 por cento dos portugueses aprovem que "coisinhas de nada" sejam retiradas do ventre de uma mulher num regime de "no questions asked" e só metade destes consintam que uma criança entregue a uma instituição possa receber o amor de um casal que a pretende integrar numa família?
Este é o meu último "post" relativo do referendo. Mais do que reflectir, seja qual for o resultado no domingo, é hora de mudar algo na cabeça dos portugueses. Para que, mesmo num quadro legal que o facilite, cada vez menos mulheres e homens do meu país tomem a decisão de recorrer a esta modalidade de planeamento familiar "a posteriori"
Este é o meu último "post" relativo do referendo. Mais do que reflectir, seja qual for o resultado no domingo, é hora de mudar algo na cabeça dos portugueses. Para que, mesmo num quadro legal que o facilite, cada vez menos mulheres e homens do meu país tomem a decisão de recorrer a esta modalidade de planeamento familiar "a posteriori"
2 Comments:
Pessoas como você alimentam-me a ilusão de que Portugal não está completamente doido. Obrigado & um abraço por este seu escrito.
já agora fico com curiosidade de saber quantos dos adeptos do não votariam sim em referedos que equacionassem os outros problemas referidos.
Tanto quanto sei tem sido o BE quem mais tem lutado por essas outras questões "fracturantes", razão pela qual é muitas vezes vítima de ironias das forças políticas mais à direita e dos cronistas com elas conotados.
No dia em que os partidos que apoiam claramente o não à despenalizaçao do aborto - o PSD e o PP - aparecerem em público a propor o casamento de homossexuais e a adopção de crianças por casais homossexuais, então sim, podemos tirar algumas ilações.
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