Friday, February 09, 2007

Nem mais um "post" para o referendo

Dizer que o "Sol" tem andado obnubilado é uma constatação que só peca por defeito. Mesmo assim, não posso deixar de dar os meus parabéns ao semanário de José António Saraiva - nem acredito que acabei de escrever estas palavras... - pela sondagem que faz manchete da edição que hoje chegou às bancas para não perturbar o dia de reflexão. Admito que não fiquei agradado com o resultado, o qual aponta uma vantagem de 18 pontos percentuais para o "sim" que talvez só uma brutal intempérie no domingo possa reverter. Mas o que me chamou a atenção foram as restantes perguntas colocadas aos portugueses pela TNSEuroteste: então não é que 58,7 por cento do eleitorado aprova a completa liberalização do aborto até às dez semanas mas só 35,4 por cento aceitariam o casamento entre homossexuais e míseros 29,7 por cento aprovariam o direito dos supracitados casais a adoptarem crianças? Sim senhor. Ao longo desta campanha fartei-me de ouvir - o que vale é que creio em certos ditados populares, como aquele do "o que vem de baixo não me atinge" - que os eleitores do "sim" são humanistas esclarecidos amigos da liberdade enquanto o "não" é constituído por uma amálgama de beatos que olham para todos os ramos das árvores à espera de terem visões, sádicos que adoram atirar mulheres desfavorecidas para celas imundas, bem-intencionados com falta de neurónios para entender o que "realmente está em causa" e sacripantas da pior espécie. É uma dicotomia que vale o que vale. Mas agora pergunto a quem acredita nisso: não ficam um nadinha aborrecidos por tão vasta fatia do vosso eleitorado - e até já estou a abstrair casos, como o meu, de eleitores do "não" que em nome da liberdade que não colide com outras liberdades votariam "sim" em referendos sobre o casamento de homossexuais e a adopção de crianças por casais homossexuais, o que ainda torna a aritmética mais interessante - aceitar uma propalada liberdade de escolha para as mulheres ao mesmo tempo que recusa os mais fundamentais direitos a cidadãos devido à sua orientação sexual? Não é curioso que 58,7 por cento dos portugueses aprovem que "coisinhas de nada" sejam retiradas do ventre de uma mulher num regime de "no questions asked" e só metade destes consintam que uma criança entregue a uma instituição possa receber o amor de um casal que a pretende integrar numa família?

Este é o meu último "post" relativo do referendo. Mais do que reflectir, seja qual for o resultado no domingo, é hora de mudar algo na cabeça dos portugueses. Para que, mesmo num quadro legal que o facilite, cada vez menos mulheres e homens do meu país tomem a decisão de recorrer a esta modalidade de planeamento familiar "a posteriori"

2 Comments:

Blogger LFQuitas said...

Pessoas como você alimentam-me a ilusão de que Portugal não está completamente doido. Obrigado & um abraço por este seu escrito.

9:12 PM  
Blogger rui said...

já agora fico com curiosidade de saber quantos dos adeptos do não votariam sim em referedos que equacionassem os outros problemas referidos.
Tanto quanto sei tem sido o BE quem mais tem lutado por essas outras questões "fracturantes", razão pela qual é muitas vezes vítima de ironias das forças políticas mais à direita e dos cronistas com elas conotados.
No dia em que os partidos que apoiam claramente o não à despenalizaçao do aborto - o PSD e o PP - aparecerem em público a propor o casamento de homossexuais e a adopção de crianças por casais homossexuais, então sim, podemos tirar algumas ilações.

7:35 AM  

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